Em 13 dezembro de 1521 morria em Lisboa o rei Dom Manuel I. Foi conhecido como “O Venturoso” pelos portugueses, autointitulado “Senhor da Guiné e da conquista, da navegação e do comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia” e desditosamente apelidado de “rei merceeiro” por seus pares europeus, num misto de desdém e inveja pelas riquezas que seu reino amealhava por meio do comércio.
Subiu ao trono no ano de 1495, ou seja, 3 anos depois da chegada de Colombo à América e 7 anos depois de Bartolomeu Dias ter ultrapassado o Cabo da Boa Esperança no extremo sul do continente africano.
Manuel I já reinava quando Vasco da Gama atingiu Calicute na Índia por via marítima em 1498, abrindo uma nova rota comercial que mudaria uma história de milênios. A chamada rota da seda, os caminhos pelos quais a seda e as especiarias do oriente chegavam à Europa, controlada há séculos pelos muçulmanos, não era mais o único caminho disponível para esse comércio.
Consequentemente também reinava quando Pedro Álvares Cabral aportou em terras brasileiras, comandando a primeira esquadra conhecida a tomar posse da Terra de Santa Cruz para o reino de Portugal em 1500. Foi D. Manuel I o destinatário da famosa carta de Pero Vaz de Caminha dando notícia do descobrimento do Brasil.
Assim como seus antecessores, almejava destruir o Islã no Marrocos e em todas as partes do além-mar. Acreditava na lenda do Preste João, um mítico rei cristão que viveria além dos domínio dos muçulmanos, na Etiópio ou nas Índias. Esse rei poderia, juntando forças com os cristãos da Europa, cercar o Islã a oeste e leste e varrê-los do mapa.
Vasco da Gama, quando parte para a Índia, leva uma carta do rei D. Manuel endereçada ao Preste João, ou seja, a missão de Vasco não visava apenas os interesses de comerciantes financiadores da empreitada, mas também os interesses militares e religiosos da Coroa portuguesa e de seu monarca.
Seu reinado ficou marcado pelos esforços de atualização das leis para contemplar os desafios de um reino em expansão territorial. A publicação das chamadas “Ordenações Manuelinas” é uma das políticas conduzidas nesse sentido.
Esse corpo de leis é o primeiro do reino de Portugal a ser impresso numa prensa de tipos móveis, invenção recente de Johannes Gutenberg. Diferente das antigas ordenações legais manuscritas, as Manuelinas podiam alcançar os diferentes cantos do reino e do ultramar com muito rapidez.
Manuel I também é lembrado por ter sido o monarca que esforçou-se, à sua maneira, para aumentar a aceitação dos judeus em Portugal e em seus domínios ultramarinos. Numa época em que o antissemitismo era muito forte na península ibérica, editou uma lei que dava aos judeus a possibilidade (ou a obrigação) de se converterem ao cristianismo e não serem mais perseguidos.
A pressão para a expulsão dos judeus vinha do reino da Espanha e uma das condições para que Manuel pudesse se casar com uma princesa castelhana era apertar o cerco contra os judeus no reino português. A conversão era a saída por ele encontrada para manter aqueles valiosos cidadãos em seu reino.
Surgem então os chamado “cristãos-novos”, que viriam a se tornar praticamente uma classe social especial no mundo português. No Brasil, os cristãos-novos terão papel importante no período colonial, como mercadores e financistas, além de pequenos oficiais anônimos atuantes em diversas profissões.
Apesar da resistência de boa parte da sociedade portuguesa em tratar com igualdade os tais cristãos-novos, D. Manuel fez o que pôde para integrá-los à sociedade. Proibiu quaisquer discriminações contra eles e instituiu até mesmo cotas para alguns cargos, como por exemplo um dos quatro procuradores do Conselho Municipal de Lisboa deveria ser um cristão-novo.