Anchieta e a fundação de São Paulo de Piratininga

O planalto, ou campo, localizado acima da Serra do Mar, a leste da Vila de São Vicente, chamado pelos índios de Piratininga, era habitado pela família do português João Ramalho e da índia Bartira, filha de Tibiriçá. O pequeno vilarejo mestiço ficou conhecido como Santo André, localizado na borda daquele campo, ainda bem próximo à serra propriamente dita.

Essa pequena vila será precursora da importante povoação que será formada na década de 50 do século XVI, sob a direção da Companhia de Jesus e de seus mais ilustres membros, os padres Manuel da Nóbrega e José de Anchieta.

A fundação da Cidade de São Paulo, Oscar Pereira da Silva

Nóbrega havia chegado ao Brasil em 1549 na frota de Tomé de Souza, e participado da fundação da Cidade de Salvador da Bahia de Todos os Santos. Era o principal responsável pela obra de catequização e alfabetização dos índios brasileiros. Anchieta chegara alguns anos depois, e juntou-se a Nóbrega na sua missão poucos anos depois, chegando à Bahia em 1553.

No ano de 1554 Nóbrega e Anchieta fundaram o colégio de São Paulo, com a intenção de educar as populações do sertão da capitania de São Vicente. Em pouco tempo se iria formar uma vila no entorno desse colégio, com a transferência da Vila de Santo André para aquela localidade, mais afastada da serra, no meio do campo de Piratininga, entre os rios Tietê e Tamanduateí.

Um dos motivos que levou à transferência da vila para aquele local era a melhor defesa militar, uma vez que a região próxima à serra era ainda de difícil defesa e a antiga vila vinha sendo atacada pelo tamoios, grupos tupis que viviam na costa brasileira entre São Vicente e a Baía da Guanabara (Rio de Janeiro), que se consideravam uma facção tupis “mais antigos”, em oposição ao chamado temiminós, considerados “mais novos”.

Também vivam na região os índios atualmente conhecidos por Guaranis, que naquela época eram chamados de carijós. Etnicamente aparentados dos tupis, eram considerados mais pacíficos e ao longo da história jesuíta no centro-sul da América do Sul, em regiões do Atual Paraná, Argentina, Paraguai etc, formaram as mais prósperas aldeias até sua expulsão.

No ano de 1555 Anchieta relata um curioso fato de um chefe carijó procurando pelos jesuítas, solicitando ajuda para educar o seu povo:

Está conosco um principal dos índios chamados carijós, que é senhor de uma vasta terra, e veio com muitos dos seus servidores só à nossa procura, afim de que corramos às suas terras para ensinar, dizendo que vivem como bestas feras …”.

José de Anchieta, Notícias do Brasil, 1555

Na Vila de S. Paulo seria instituída a Câmara Municipal, instituição pública existente até os dias atuais, embora com forma e atribuições bastante diversas daquela época.

O padre Anchieta viria a se tornar um personagem notável do Brasil no primeiro século de sua história. Observador minucioso da natureza e dos costumes dos habitantes, registrou em suas cartas importantes observações para nosso conhecimento séculos depois. Pode-se considerar, portanto, que Anchieta tenha sido o nosso mais antigo botânico, zoologia e também antropólogo, na medida que procurou à sua maneira conhecer a natureza das coisas e gentes que vivam nesta terra, além disso músico, dramaturgo e educador.

Estamos, como lhes escrevi, nesta aldeia de Piratininga onde temos uma grande escola de meninos filhos de índios, já ensinados a ler e escrever, e aborrecem (têm aversão) muito os costumes de seus pais, e alguns sabem ajudar a cantar a missa, estes são nossa alegria e consolação porque seus pais não são muito domáveis, posto que sejam mui diferentes dos das outras aldeias porque já não matam nem comem contrários (inimigos), nem bebem como antes.

Idem

Foi também gramático, tendo publicado uma obra onde sistematizou a “Língua mais usada na costa do Brasil”, o que viria a ser chamado pelo nome de tupi-guarani ou também nhengatu, idioma que se espalhou por todo o Brasil como língua franca de catequização dos índios pelos jesuítas.

Teve importante papel diplomático, auxiliando a estabelecer a paz entre os portugueses e tamoios do litoral de S. Paulo ao Rio de Janeiro.

Faleceu em 1597 em Reritiba, no Espírito Santo e foi canonizado no ano de 2014 pelo Papa Francisco, sendo a partir de então considerado um Santo pela Igreja Católica.

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